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“Não troco meu “Oxente” pelo “ok” de ninguém” – Ariano Suassuna

domingo, 27 de abril de 2014

Padre Djacy Brasileiro é destaque no portal IG

Alexandre Medeiros - IG
 
Rio - Poderia ser mais um passeio sentimental pelas esquinas da minha infância, a Praia do Flamengo, o Aterro, os jardins do Palácio do Catete. Mas uma movimentação incomum nas cercanias do velho Hotel Novo Mundo me levou ao Vale do Piancó, nos confins da Paraíba. Foi lá que conheci ano passado, ao fazer uma reportagem sobre a seca no Nordeste, o padre Djacy Brasileiro. Um andarilho que leva o Brasil no sobrenome e o Evangelho ao pé da letra: só entende o sacerdócio se ele for exercido ao lado dos que mais precisam. 
Cenas Cariocas: O padre e a médica, tão longe, tão perto
Foto:  Severino Silva e Alexandre Medeiros

Padre Djacy, o senhor ficaria feliz de ver o que eu vi. Carros e vans do interior fluminense lotavam a Praia do Flamengo e a Rua Silveira Martins, um entra-e-sai de malas, motoristas com listas de passageiros nas mãos. Miguel Pereira, Silva Jardim, Três Rios, Miracema, Rio das Ostras. As pessoas apressadas. Muita gente falando espanhol. Padre, acredite, eram médicos cubanos.
Sim, aqueles mesmos que o senhor um dia chamou de anjos “porque vêm ao encontro dos pobres”. O saguão do Hotel Novo Mundo é um cenário de despedidas e ansiedades nesta tarde nublada e abafada de outono. São 165 médicos cubanos que fecham um ciclo de adaptação e agora partem para seus destinos. Com estes, são 457 profissionais que chegam ao estado dentro do Programa Mais Médicos. Alguns ficam pela capital, mas outros, como o senhor sempre defendeu, vão para o interior, onde estão as pessoas mais esquecidas.
Já na van que o vai levar para Barra Mansa, o casal de médicos Yoanny Delgado e Yulisa Martinez fica acabrunhado em dar entrevista. Ainda estão marcados pela recepção pouco amistosa de alguns médicos brasileiros à chegada dos cubanos ao país. “Só queremos trabalhar em conjunto, ajudar as famílias no interior a ter saúde melhor. Só isso”, diz Yulisa. Os dois pretendem ficar os três anos de contrato, e voltar para Cuba para ter o primeiro filho.
O acabrunhamento é compreensível. Lembro quando o senhor postou no Facebook, em 28 de agosto do ano passado, um desagravo ao médico cubano Juan Delgado, que foi hostilizado por colegas brasileiros ao desembarcar em Fortaleza, dias antes, para se dispor a trabalhar em lugares refutados pelos profissionais pátrios. O senhor pediu ao Juan desculpas por todos nós: “Se alguém encontrar esse médico por aí, por gentileza lhe dê um abraço, peça desculpas, agradeça sua boa-vontade e avise que não somos todos assim.”
Ainda bem que não. Não esqueci suas palavras pedindo médicos para cidades que estão no mapa, mas parecem não estar no mundo, como as pernambucanas Vicência, Muropé e Afogados da Ingazeira, ou as do seu Vale do Piancó, como Curral Velho e Pedra Branca.
O senhor precisava ver a simpatia de Madeleinys Monterrey, uma especialista em Medicina Integral, ao embarcar na van para Maricá. Ela é essa aí da foto, que eu mesmo fiz, bem em frente ao Aterro onde arranhei joelhos e cotovelos jogando bola nos campos de terra que agora são de grama sintética. Parecia uma velha amiga ao contar que é de Pinar del Río, famosa por suas plantações de tabaco e por produzir os melhores charutos do mundo. “Minha esperança é ser bem-recebida e fazer o que sei fazer, que é cuidar das pessoas”, ela diz. Madeleinys é solteira, quer ficar três anos no Brasil e, se arranjar namorado, pretende convencê-lo a ir para Cuba. Será um sujeito de sorte.
Cada um tem seus sonhos. O senhor, padre, que tem como armas as palavras e as solas dos sapatos, acalanta os seus. Ver a gente pobre mais bem tratada, com água o ano inteiro, com médico para quando precisar. Andando pelas pedras da Praia do Flamengo, onde já cultivei tantos sonhos e vi outros tantos se perderem, fico imaginando se, no fundo, esses anseios acabem se unindo de alguma forma. Seja em Cuba, em Maricá ou no Vale do Piancó. Talvez.
Yulisa e o marido Yoanny já parecem mais dispostos na despedida. Perguntam se Barra Mansa é violenta, se fica perto do mar. Com seu sorriso aberto, Madeleinys arrisca algumas palavras em português antes de partir. Digo a ela algo que o senhor gostaria de dizer: “Temos que te agradecer por ter saído de sua terra e ficar longe de lá por três anos para melhorar a vida da gente”. Ela se emocionou, eu também. Se ela vai ficar os três anos, se vai aguentar a saudade, isso eu não sei. Mas a alegria dela contagiou esse pedaço da Praia do Flamengo, padre. Que chegue ao Vale do Piancó. Boa Páscoa para o senhor.

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